29.9.08

será

Se você vem, então o amor existe.

Mas, se você some, se você hesita
Ah, mas, se você me evita.
Se conserta o que não somos e nos desconcerta.
E se quando as coisas gritam no teu quarto meu nome,
daqui eu te peço baixinho que não nos desmereça,
tocam as músicas que trocamos,
e você não ouve.
Se nada disso ouve,
nada disso houve.

13.9.08

sopro

Antes de dormir, leio outra vez sobre aquele lance de funcionários do metrô que, de luvas, empurram os passageiros para dentro dos vagões e empurrar não é a palavra, quero algo melhor, que traduza a sensação de esmagamento, o suor de centenas de japoneses em um espaço mínimo, ironicamente feito de lata. Da primeira vez, na verdade, não li, alguém me contou. Uma dessas pessoas que contam várias coisas [e depois roubam nossas mulheres]. Tiram coisas dos bolsos, pequenas e absurdas, aos montes. Fico sempre a me perguntar por onde passam e recolhem tudo isso, que tamanho têm os bolsos - eu, que me distraio tão facilmente de ser o que gostaria de ser e de me abaixar na rua para procurar as coisas rasteiras, as coisas que voam para debaixo das bancas de jornal, como os meus dez reais daquela vez em que me senti patética, protagonista do ótimo conto que eu não sou capaz de escrever, escrever, escrever - deve ser esse o fluxo de pensamento mais forçosamente psicografado desde. Já disse que tenho tido dificuldades, e só o que sai são cartas, bilhetes, dizeres, dizer a alguém qualquer coisa de agora, essa vontade de me corresponder largamente com todas as marianas. Contar a você que esqueci de pensar sobre o papel do Estado. Sim, nós prevíamos tal coisa, mas só ontem fui flagrada e tive que fugir, levantar da mesa e correr disparado pelo saguão do restaurante, derrubando talheres pesados e delicados garçons, porta a fora, pela chuva, eu e o meu medo da farsa descoberta, eu e a vontade de não pertencer ao jogo dos argumentos, ao nojo dos argumentos. Mas, sim, eu os argumentos soldados de minha muralha de verdades putrefatas, que guardam somente joelhos dobrados no chão, a entrega, o alívio da rendição, resguardado por tudo aquilo que agora escorre com a chuva, pela roupa encharcada, pelos cabelos ensopados, pela calçada...